Postal 1223 - Braga - Falperra (Portugal)

A propósito deste Postal Centenário recebemos preciosa informação do Exmo Sr. Gabriel Mendes Da Costa que, depois de devidamente autorizados, passamos a transcrever:

«Tanto o edificio, que hoje é o Hotel Golden Tulip "Braga", como a capela, não pertencem a Braga mas sim a Longos, Guimarães.

Na verdade sempre pertenceu a Guimarães.

A história deste santuário é interessantíssima e dizem que a rivalidade entre Braga e Guimarães tem o seu expoente na interminável luta pela posse da capela.

Duas coisas são certas, estão feitas por uma ordem Bracarense, mas em terreno Vimaranense.

Uma das explicações que encontrei para este facto é que, no séc XVII, devido à peste negra, as paróquias Bracarenses de Fraião e Nogueira (onde se situam parte deste santuário), foram anexadas à de Santa Cristina de Longos, Guimarães.

A capela aí retratada, junto com o antigo convento, que passou a seminário e, antes de cair em ruínas, a albergue de retornados de guerra, são de finais de Séc XVII.

Ou seja, na altura que foram feitas, não haveria, por ventura, qualquer distinção entre as freguesias.

Todos os anos, a 29 de Julho, se faz a Romaria de Santa Marta da Falperra e de Santa Maria Madalena. É ainda hoje uma das mais típicas do Minho, sem música que não seja dos tocadores de concertina e sem animação outra que a dos pique niques dos romeiros.

O meu falecido avô, grande cantador de desgarrada no tempo dele, era visitante assíduo e, mesmo migrando para a margem Sul na década de 60, voltava todos os anos, preciso como um relógio, à sua Romaria.

Contava-me ele que as cenas de pancadaria entre Vimaranenses eram épicas. Não havia ano que a rixa não fosse potenciada pelo Vinho e as bocas mal dadas na cantoria.

Antigamente, reza a história, as paróquias Vimaranenses e Bracarenses, promoviam estas zaragatas, oferecendo vinho em abundância. Depois de "varrerem a feira" (termo usado quando explodia a pancadaria, sempre com as varas de marmeleiro usada no antigo jogo do pau), quem ganhasse tinha direito a explorar a capela.

Mas isso são outros tempos.

Foi também neste local, na estrada que está aí retratada da Falperra (nome que significa estrada povoada de ladrões e onde acontecem assaltos), que se escondeu, por muito tempo, Zé do Telhado.

Um dos mais interessantes pormenores da fotografia é observar que a serra da Falperra estava ainda, nesta época, sem vegetação. Hoje, é um enorme eucaliptal o que, tristemente, suga toda a riqueza da montanha. Riqueza esta que se fundamenta nas enormes quantidades de água que aí nasciam e hoje são roubadas por estas árvores invasoras.

De notar que o culto pagão original, que resultou na cristianização deste ermo, estava baseado na água e na importância que ela tinha. Ainda hoje, a fonte do Leão lá presente, oferece uma das águas mais puras da região e são filas de pessoas a ir colhê-la.

Antigamente, a minha avó contava-me que, no dia da Romaria, enfeitavam a fonte com flores e fitas às cores e todas as pessoas se purificavam com a sua água antes de entrar na capela.

A nascente que desagua para sul, no Ave, fazia rodar centenas de moinhos e, a importância deste elemento para as pessoas era tal que, quando haviam seca, subiam à ermida (perto do ponto onde foi tirada a foto) com a figura da santa. Davam três voltas ao santuário com ela e, segundo dizem, vinha chuva.

Pessoalmente, este local diz-me muito porque é o local da Romaria da minha freguesia. Todos os anos junta-se toda a família e amigos. Muitos vem mesmo do estrangeiro mais cedo para poder cumprir este ritual quase sagrado.

Com certeza este pequeno relato constituirá um pormenor interessante para eventuais interessados (e ainda muito mais há a dizer sobre este local, factos que, indubitávelmente, ajudaram à cristianização da "montanha Sagrada").»

Gabriel Mendes Da-Costa